domingo, 24 de outubro de 2010

Cansei

Cansei de viver mil vezes em apenas uma vida,
lutar por causas perdidas e sempre sair sem medalha,
cansei de estar antes do ontem e depois do amanhã,
desconhecendo a palavra recompensa apesar dos meus atos.
Cansei de caminhar na dúvida, não tenho mais certezas,
corro atrás das nuvens num dia de sol
e alcanço o sol num dia de chuva.
Chega de chorar e sorrir com tristeza,
cancelar sonhos em prol de terceiros,
acreditar em coisas que ninguém mais acredita,
esperar quando ninguém mais espera.
Chega de identificar um sorriso triste
e uma lágrima falsa
cair no fundo do poço e não ter ajuda,
me enganar e sempre me dar mais uma chance.
Cansei de estar em mil lugares de uma só vez,
fazer mil papéis ao mesmo tempo,
ser forte e fingir ser frágil pra ter um carinho...
Cansei de me perder em palavras
e depois perceber que me encontrei nelas,
distribuir emoções que nem sempre são entendidas.
Cansei de comprar, emprestar, alugar, vender sentimentos,
mas jamais dever,
construir castelos na areia,
vê-los desmoronados pelas águas e ainda assim amá-los.
Chega de saber dar o perdão,
e tentar recuperar o irrecuperável,
entender o que ninguém mais conseguiu desvendar.
Chega de estender a mão a quem ainda não pediu,
e doar o que ainda não foi solicitado...
Tenho vergonha de chorar por amor,
não sei a hora certa do fim,
espero sempre por um recomeço...
Não tenho mais a arrogância
de viver apesar dos dissabores,
das desilusões, das traições
e das decepções.
Sou mãe da minha filha e não
dos filhos dos outros.
Não tenho total confiança no amanhã
nem aceitação pelo ontem,
Desbravo caminhos difíceis
em instantes inoportunos
sem fincar a bandeira da conquista.
Volto no tempo todos os dias
e vivo por poucos instantes
coisas que nunca ficaram esquecidas.
Não tento mais encontrar
uma flor no deserto,
água na seca e labaredas no mar.
Cansei de chorar calada
as dores do mundo
e em apenas um segundo já estar sorrindo.
Subo degraus
e se tiver que descê-los
não preciso de ajuda,
tropeço, caio e volto a andar.
Chega de ser super-homem
quando o sol nasce
e virar Cinderela
quando a noite chega.
Cansei!
Cansei de ser acima de tudo
um estado de espírito,
ter dentro de mim
um tesouro escondido
e não poder dividi-lo com o mundo!!!
(Escrevi isso baseada em uma daquelas "lindíssimas" e inúteis mensagens de auto ajuda que lotam minha caixa de emails. Bastou inverter os sentido das frases...)

sábado, 16 de outubro de 2010

Couro cru

Couro Cru
Leopoldo Rassier
Couro cru, carnal a mostra,
Não sou feito pra quem gosta
De várzeas sem tacurus.
Outro curtido não tive
Que a chuva caindo livre
No canal de couro cru.
Batido a sol e sereno,
Sou pequeno entre os pequenos,
Igual entre os meus iguais.
Um lombo-duro entre os fortes
E embora vergue ou me entorte
Ninguém me põe nos varais.
Me apontam o dedo
Me chamam bagual,
Matambre dos duros,
Sem cinza e sem sal.
Sem furo na guampa,
Sem marca ou sinal,
O dedo me apontam,
Me chamam bagual!
Couro cru, carnal a mostra,
Não sou feito pra quem gosta,
De várzea sem tacurus.
Aos que me apontam o dedo
Falta cerne ou sobra medo
Pra sovar um couro cru...
Pra sovar...
Um couro cru!